sábado, 13 de setembro de 2008
Quique Flores em Entrevista à Bola
Ao longo de duas horas de entrevista, o treinador do Benfica fez para A BOLA o primeiro balanço de um Benfica renovado. Quique Flores sabe os terrenos que pisa, sabe com o que pode contar e garante, sem falsas modéstias, estar «muito preparado» para esta etapa da sua carreira. Não promete títulos, mas quer ver os adeptos a sonhar...
Entrevista de josé manuel delgado, paulo alves e fernando urbano
Estava à espera de encontrar aquilo que encontrou no Benfica? A dimensão do clube, a pressão que existe...
— A percepção inicial era essa. Sabia que o Benfica é o clube maior de Portugal, sabia da sua história. Mas o nível das infra-estruturas confesso que superou as minhas expectativas: são do melhor que há na Europa. É importante que esta dinâmica de crescimento se mantenha e espero poder contribuir.
— Já sentiu que no Benfica existe pressa em fazer as coisas bem?
—Foi um dos desafios que me levou a aceitar o convite. Os clubes grandes têm visão ampla. E quem tem visão ampla não está preocupado só no dia-a-dia, tem projectos com horizontes largos. E isso serve para caminhar em frente. E quando se caminha em frente apanha-se chuva miudinha, que nos dá capacidade para chegarmos ao que queremos. Não gosto de estar à porta das urgências, pois aí todos se precipitam. Um treinador até pode ganhar um título nas urgências, mas se ele sair e chegar outro, sem a mesma planificação, o título anterior não servirá de nada.
Sabia que iria ter um início de campeonato forte. Esperava chegar à segunda jornada com apenas dois pontos?
— Quando começamos um campeonato queremos sempre arrancar bem. Mas o que se faz em dois jogos pode ser muito enganador. Não é o melhor arranque, mas é o arranque normal. O campeonato é uma prova de resistência, não de velocidade.
— Já dissera, ainda antes do início da Liga, que precisava de mais um mês de trabalho...
— Ainda estamos muito longe da equipa que queremos ser. Nestes dois meses mudámos a dinâmica da equipa. Tivemos uma pré-época dura, defrontámos equipas fortes. Por exemplo, a equipa tem uma dinâmica que se perde agora [ausência de muitos jogadores nas selecções] mas estamos a tentar fazer tudo para tornar esta equipa ganhadora. Uma equipa como o Benfica tem de estar habituada a ganhar. Mas para isso é preciso tempo.
— Mas sente que tem condições para lutar pelo título?
— A nossa obrigação é estar o mais alto possível e adeptos devem ter esperanças altas, é o seu papel. Quero uma ambição medida, não desmedida. Toda gente tem ambições, mas mais importante que isso é o projecto, o trabalho, o conhecimento. Queremos procurar títulos, estar na linha da frente, mas a pressão desmedida acaba por ser um contra para os próprios jogadores. Se eles jogam pressionados, com tensão normalmente jogam mal, não acertam três passes seguidos. Não confundir pressão com responsabilidade. Tudo farei para tirar pressão aos jogadores, mas a responsabilidade terá de ser total. Quando assinei fiquei impressionado com o estádio, grande, moderno, capaz e preparado para receber grandes espectáculos e disse ao presidente e ao Rui que o nosso principal objectivo para esta época é alimentar a ilusão, mas para conseguir isso temos de ganhar jogos. E se ganharmos jogos somos candidatos ao título.
— Ajudou a criar projectos no Getafe e no Valência. Mas não os terminou. Aqui gostaria de construir e finalizar o seu projecto?
— Quando uma casa começa a ser construída depressa de mais fico sempre com dúvidas. É preciso saber se as bases estão bem solidificadas, se as paredes estão bem colocadas. No Benfica ainda estamos a trabalhar a base. Nós temos um projecto de dois anos e espero que sejam dois anos que venhamos a recordar como bons e deixar bases sólidas para o futuro.
— E não tem medo de falhar?
— Conheço muita gente no futebol com medo de falhar. Mas eu não tenho, sou sincero. Passei por situações tão difíceis e dramáticas na minha vida pessoal a ponto de ter aprendido a relativizar tudo o que diz respeito ao futebol. Não o considero uma brincadeira, mas relativizo-o. É importante, porque traz felicidade às pessoas, mas é apenas futebol.
— Essa sua forma de pensar contraria a imagem que fazíamos de si: um viciado em trabalho...
— [risos] Podemos trabalhar muito, mas isso não significa que não possamos relativizar o que fazemos. Por isso é que não tenho nem quero ter medo, porque o medo paralisa as pessoas. E se não tenho medo, sou seguro do que faço. A segurança pode custar a obter, mas tenho razões para a ter: primeiro porque tenho um grupo de trabalho excepcional; segundo, porque sinto-me muito preparado para fazer o que faço.
«chateado quando um jogo sai do guião»
— O que faltou para ganhar o jogo com o FC Porto?
— Faltou que ficámos com menos um jogador. Se tivéssemos jogado sempre com 11 jogadores acho que poderíamos ter terminado o jogo como o começámos. Mas circunstâncias várias mudaram o rumo do encontro. Fico muito chateado quando acaba o jogo e percebo que o guião foi muito alterado da nossa parte.
— E o que saiu do guião?
— Estávamos preparados para uma coisa e saímos do nosso guião. Fizemos o 1-1 e sentia que podíamos chegar ao 2-1, mas entretanto deu-se a expulsão e nessa altura tive de mexer na equipa.
— E tirou Cardozo...
— Foi uma das substituições mais dolorosas que tive de fazer na minha carreira, temi que não fosse entendida, mas fiquei contente porque as pessoas perceberam as circunstâncias. Mudei porque estava a ficar com a sensação que íamos sofrer muito com dois avançados.
— A expulsão foi determinante para o aparecimento dos problemas físicos?
— São coisas diferentes, não tem a ver com isso. Porque quando se joga com dez a generosidade aumenta. Quando isso não sucede, é preciso analisar porquê.
— Falou-se muito sobre a questão física. Foi a mudança dos métodos de trabalho que provocou a falta de pernas no 'clássico'?
— Em termos físicos, temos a máxima confiança no trabalho de Pako Ayestarán. É um homem de muita experiência europeia, conseguiu muitos êxitos, leva 20 anos a treinar em clubes de top. Quando analisámos juntos o jogo com o FC Porto, chegámos à conclusão de que duas ou três situações, que entendo devem ser debatidas apenas internamente, provocaram várias reacções em cadeia.
— Quer explicar melhor o que quis dizer quando afirmou que os jogadores não estavam habituados a esta forma de trabalhar?
— Acho que fui mal interpretado, porque não gosto de entrar em comparações com o que outros treinadores fazem. Mas a verdade é que os jogadores têm sido submetidos a uma exigência física muito grande, quer no trabalho diário, quer nos próprios jogos. Porque temos-lhes pedido muita coisa: que tenham boa condição física, boa capacidade de recuperação, capacidade de subir rapidamente à área contrária, fazer pressão... estamos no princípio da época e isto leva tempo.
— A preparação física é baseada consoante o modelo táctico?
— Exigimos que os jogadores tenham uma grande capacidade física. Se queremos manter a defesa um pouco mais alta, significa que os avançados tenham ainda mais capacidade para impedir que a equipa adversária pense quando tem a bola; se queremos atacar sem sermos sujeitos a contra-ataques perigosos e possamos defender 40 metros atrás, teremos de ter uma capacidade de recuperação muito boa. Para isso é preciso ter uma grande preparação física: ter força, velocidade e resistência. Estamos num processo em que o trabalho de Pako não pode ser considerado melhor ou pior: é diferente. Logo os jogadores demoram a adaptar-se.
— Para si, todos os jogadores têm de trabalhar defensivamente?
— Têm de trabalhar. A mecânica de uma equipa é feita em cadeia.
«Reyes pode 'explodir' no Benfica»
— Cardozo e Suazo podem jogar juntos?
— Perfeitamente. No Valência coloquei Villa e Morientes juntos, por exemplo. No meu tempo no Getafe também jogavam dois avançados. Mas há uma coisa que devo dizer: a nossa forma de jogar não é condicionada pelos resultados, a preparação dos nossos jogos é feita de acordo com o que convém à nossa equipa. Mas também temos Nuno Gomes...
— Pode alguma vez jogar com este trio: Cardozo, Nuno Gomes e Suazo?
— É complicado, porque são três avançados que não casam de forma a dois deles poderem jogar à frente e outro atrás deles, ou alguns deles jogarem pelas alas. Dois deles juntos, sim; os três, não. Suazo fará bem a posição de ala, mas não Nuno Gomes ou Cardozo. É muito importante que quando se esquematiza um sistema, que isso se faça pela qualidade dos jogadores.
— O que espera de Reyes no Benfica? Já foi considerado um dos melhores atacantes do Mundo, depois foi caindo.
— Reyes está aqui porque consideramos que é um jogador importante, que pode provocar desequilíbrios. Mas há que ter cuidado especial na gestão do rendimento de determinados jogadores, porque estão numa situação quase limite, que a todo o momento podem rebentar. E isso depende muito da vontade desses jogadores. Não lhes prometemos mais que a outros. A Reyes dei-lhe a entender que no Benfica pode explodir, mas dentro do plano que traçamos, ou seja, que está num bom clube e com uma boa equipa técnica. Mas eu não sou um psicólogo dos jogadores de futebol. Sou um treinador que deve gerir parte das emoções mas não a partir do momento em que estes vão em direcção contrária. Porque quando isso acontece eles transformam-se em estátuas de pedra. Portanto, no caso dos jogadores que eu pedi, como Reyes, penso sempre positivo: que são jogadores talentosos, com oportunidade de explodirem e, se o fizerem, são jogadores de nível superior.
— E está com alegria a trabalhar?
— Sim. Só trabalhou connosco duas semanas antes do jogo com o FC Porto. Gostei da forma como entrou com o Inter e fez um bom jogo com o FC Porto. Não tanto pelo desequilíbrio, porque era um jogo difícil, mas analisando o jogo posteriormente chega-se à conclusão que ele se esforçou muito. E nós sabemos o que ele fez nos últimos anos. Por isso acho que foi um bom começo para ele. Mas se achar que o que ele fez é suficiente, é um erro. Deve continuar a trabalhar o seu sistema emocional para recuperar a sua confiança como jogador, à semelhança de Suazo, pois ambos vivem situações semelhantes.
— Disse um dia que Aimar é um jogador «mais para decidir jogadas do que jogos». É assim que o continua a ver?
— Na altura disse isso quando me pediram para o comparar a Riquelme. Sobre Aimar recordo os bons tempos que passámos no Valência. Fez uma espectacular dupla de ataque com Villa. Pensa muito rápido e raramente se engana. Porque há muitos jogadores que pensam rápido mas que se enganam muito.
— Ele ainda não mostrou o seu verdadeiro valor?
- Ainda não houve tempo para se ver o verdadeiro potencial de todos os jogadores do Benfica. Há uma grande curiosidade em ver o que fazem estes jogadores novos. Se eu fosse adepto, todos os jogadores ainda estariam por descobrir. Há coisas que os jogadores vão mostrando pouco a pouco, mas eles ainda estão muito longe de fazer aquilo que podem fazer mais para a frente.
— Aimar precisa de um trabalho específico, tendo em conta o seu passado de lesões?
— Com Aimar é preciso haver alguma delicadeza, pois tem um historial diferente de outros. Mas há que lembrar isto: ele nunca teve problemas físicos connosco no Valência e existe uma confiança enorme de que o melhor Aimar viu-se nos tempos em que trabalhou com Pako Ayestaran. Aimar estará em boas condições para nos ajudar a ganhar muitos jogos.
— Em que posições pode ele jogar?
— Como médio, segundo avançado (como o tem feito no Benfica) ou jogando nas alas.
A— Na sua cabeça conta com o avançado Di María?
— Sim, claro. Creio que seria muito mau para o Benfica, para a equipa, se assim não fosse.
— A questão é que só podem jogar 11: não terá problemas com jogadores que não aceitem o banco?
— Nunca tive problemas em relação a isso. Para mim não é nenhum drama ter de fazer a convocatória ou escolher o onze. E não é nenhum drama porque essa é a minha profissão. Não digo que ocasionalmente não tenha dúvidas, mas isso é normal. Não me esqueço dos jogadores que não convoco e preocupo-me com eles, mas tenha a consciência tranquila quando faço a equipa.
— Não foi arriscado colocar Di María no clássico, pois tinha trabalhado pouco tempo consigo?
— Foi uma tentativa de aproveitar uma dinâmica positiva. Trata-se de um jogador que acabou de ganhar uma medalha de ouro nos olímpicos, era um jogador que vinha muito motivado e tínhamos que aproveitar isso. Além disso, é um jogador que já conhece bem o Benfica e o ambiente nestes grandes jogos.
— Os colossos europeus descobriram de repente Di María, sendo ele um jogador muito novo não afectará a sua cabeça?
— Creio que não. Ele está com a cabeça no Benfica e sabe que é esta equipa constitui uma forma de ter maior visibilidade na Europa. Ele saberá como agir quando tiver ofertas e o melhor para ele neste momento é seguir no Benfica.
— Saiu Petit, que era um dos históricos. Na época passada saiu Simão. Quem pode ser o líder do balneário agora?
— Eu prefiro ter líderes dentro de campo do que líderes no balneário. Conheci poucos líderes de balneário na minha carreira de jogador. Lembro-me de alguns no Real Madrid, como Hierro, Sanchis, Butrageño, Michel, mas não existia essa liderança espectacular no balneário como as pessoas pensam. Não acredito muito nisso, essa liderança reduz-se a casos muito particulares como foi o caso de Beckenbauer, Bobby Charlton, jogadores que tinham uma grande personalidade. Gosto, isso, sim, dos jogadores com forte personalidade quando entram no relvado, que tenham a capacidade de resolver as situações. Porque no balneário podemos ser todos muito educados ou mal-educados, mas essa situação cabe aos treinador analisar. Mas no campo não posso fazer nada: tenho um limite, ficamos no outro lado da fronteira e quem resolve os jogos são os jogadores. E aí é que surgem os líderes.
— E quem pode ser esse líder no campo?
— Ainda é muito cedo para dizer. Luís Aragonés diz isto há muitos anos: «Não quero ter um líder, antes quatro ou cinco 'corredores de segurança' dentro de campo.» Concordo totalmente.
— Mas gosta de ter um jogador que seja a extensão do treinador dentro do campo?
— Sim. Às vezes não dá para falar com quatro ou cinco jogadores ao mesmo tempo e esse elemento é fundamental numa equipa. Mas que aparece de uma forma muito natural. No Valência, tinha Ayala.
— A liderança no campo pode ser dissociada da liderança no balneário? Como é que um jogador dá instruções a outro se não tiver moral junto do colega?
— A nível de sistema de jogo, todos são novos. Todos partem do zero! Mas há jogadores que começam a perceber mais rapidamente o método e ter influência junto dos colegas. Não gosto de particularizar, mas tenho de dizer que Luisão está a entender bem a nossa metodologia e que de alguma forma está a colaborar muito para que as coisas se encaixem. Não é pelo facto de ser o capitão na ausência de Nuno Gomes, mas pelo facto de ter uma visão panorâmica lá atrás, na defesa, podendo ver o que está a ser bem ou mal feito.
«Nem sempre se ganha jogando bem»
— O seu futebol é de ataque?
— O meu futebol é de uma visão ampla. As minhas equipas tanto jogam mais atrás como mais à frente. Há seis anos que treino e posso dizer que em cada época, apenas um ou dois jogos me surpreende relativamente ao que espero das minhas equipas. A minha forma de estar no futebol é esta: não ter surpresas. Quero que no final da época, e depois de 60 jogos, os jogadores pensem: «jogámos tal como o treinador nos pediu.» Isso é muito importante. Quanto ao futebol mais ofensivo ou não, depende muito dos jogadores.
— Quem joga bem está mais perto de ganhar?
— Não. Quem tem bons jogadores está perto de jogar bem. Mas nem sempre se ganha jogando bem.
— Mas muitas vezes ouvimos os treinadores queixarem-se do azar, quando o dever das suas equipas é jogar bem...
— Sou mais apologista desta ideia: quanto mais trabalhas, mais êxito tens. Porque isso da sorte ou azar... isso não. Trabalho e sorte é um casamento muito feliz mas...
— Quer as suas equipas a jogar sempre com dois médios centro?
— Tenho uma visão ampla. Não condiciona o equilíbrio da equipa se tivermos um jogador a actuar atrás de dois avançados; ou se tivermos apenas dois médios-centro; ou apenas um médio-centro e quatro jogadores mais à sua frente, como fez a selecção espanhola.
— No futuro poderá fazer alterações tácticas ou este sistema é para manter?
— Quando se está a criar um menino (e esta analogia aplica-se ao trabalho que estamos a fazer no Benfica) não se pode mudar muita coisa antes de saber se ele será bonito, feio, louro ou moreno. Por isso, há que aperfeiçoar um sistema para posteriormente trabalhar as suas variantes. Queremos ter segurança nesse trabalho, pois a partir daí poderemos trabalhar os mesmos movimentos, mas vários metros à frente ou atrás.
— A qualidade do futebol é muito diferente de Espanha para Portugal?
— Sobretudo a nível dos recursos. Os clubes médios em Espanha subiram muito nos últimos anos, têm orçamentos muito elevados e isso creio que é o que faz a diferença entre as duas ligas. Daí o futebol ter depois maior competitividade, porque qualquer equipa pode perder em qualquer estádio.
«David Luiz tem nível mundial»
O treinador espanhol vê grande futuro para o central, mas, para já, prioridade à recuperação
— David Luiz: o que se passa com ele?
— Está há muitos meses sem jogar, e quando isso acontece os jogadores 'oxidam'. É normal neste tipo de processo. E a oxidação num futebolista não é fácil de recuperar. É verdade que vejo muitas qualidades no David, incluindo a capacidade de sofrimento, pois, por vezes, treina-se com dor. Em condições será um jogador capaz de atingir um nível muito alto, a nível mundial, um dos melhores centrais da Europa. Mas primeiro temos de lhe retirar essa oxidação, que lhe afecta desde a parte muscular até à parte psicológica.
— Quando pode voltar?
— Não sabemos. Esta semana mudámos a dinâmica de forma a ajudá-lo da melhor maneira possível a ultrapassar esta fase.
«Satisfeito com Diamantino»
Diamantino e Chalana têm, garante, papel fundamental na estrutura da equipa
— Muito se tem falado de Diamantino e Chalana. Quais são, na realidade, as suas funções?
— Quando chegámos, aquilo que dissemos é que cada um tivesse lugar num posto onde fosse mais eficaz, pois além do trabalho de campo há muitas outras coisas a ter em atenção. E os resultados daquilo que têm feito deixam-me muito satisfeito, tanto ou mais como o trabalho de campo.
— Mas fica ou não 'enfadado' quando vê que um adjunto se senta na tribuna presidencial ao lado do director-geral?
— Eu não perco tempo a analisar esse tipo de coisas. São fruto da especulação jornalística. Durante os jogos concentro-me apenas no que se passa no relvado e em como posso ajudar a equipa, nada mais... Não valorizo essas situações.
Sidnei
— Quando entrou com o FC Porto não se equivocou e marcou na linha, que é o que pedimos aos defesas. Ficámos com muito boa impressão. Estes jovens têm de saber fazer a leitura do que é chegar a um clube como o Benfica e esperar pela sua oportunidade e estar preparados. Mesmo que não jogue, é importante que esteja preparado.
Luisão
— Ainda não sei se vamos poder contar com ele para os próximos jogos da Liga. Este castigo é uma situação estranha, sancionar um jogador pelas imagens... lances como aquele em que esteve envolvido, na marcação de um canto, acontecem todos os jogos, em plena área, é uma situação constante. Mas resulta mais estranha quando verificamos que outro tipo de imagens não foi transmitido, no caso o episódio entre Rodriguez e Nuno Gomes. Esta semana um jogador nosso falou que tinha sido uma discussão normal em futebol? Isso está certo! A discussão a seguir à agressão é normal... o que não é normal é a agressão que a antecede.
Zoro
— Não entrava nas minhas contas. É verdade e nunca o escondi, mas como não foi possível resolver a sua situação foi reintegrado. Quero o melhor para ele e o facto de não ser opção aqui, não significa que não possa ser feliz em outro clube. Neste momento está reintegrado e vai continuar a trabalhar.
Mantorras
— Está num processo em que tem de melhorar a sua condição física. Esteve também muito tempo parado, teve uma lesão muito grave. Quando estiver bem, faremos uma reavaliação. Temos de respeitá-lo enquanto pessoa, que teve um grande infortúnio, e recuperá-lo para a competição.
Nuno Gomes
— Contamos com ele. No Verão falou-se e escreveu-se que ele podia sair, mas em nenhum momento esteve fora dos nossos planos. Nuno é muito participativo em tudo. Por exemplo, durante o estágio em Óbidos, quando fomos atravessar o rio nas jangadas ele foi dos que tiveram maior intervenção na construção da jangada. Expôs a sua magnitude sendo o primeiro a avançar para o desafio. Como jogador também é assim.
Katsouranis
Quique assume «conversa dura mas franca» com o grego após o clássico. Conta com o jogador, mas admite deixá-lo sair se este quebrar as regras
Katsouranis teve dois erros individuais no clássico e é público que não se sente feliz. Acha que o seu subconsciente o terá traído?
— Sem falar no caso concreto de Katsouranis, conto o que aconteceu comigo no Valência: quando eu sentia que um jogador não estava bem mental ou fisicamente, aplicávamos a regra da substituição. Mas isto não se aplica a Katsouranis.
— Se ele jogou, é porque sentia que estava bem física e mentalmente?
— Nós só queremos jogadores que queiram defender as cores do Benfica, que quando entrem em campo se apresentem no limite das suas capacidades. Se há limitações, assumimos, mas aí o erro será do treinador.
— Foi apenas um dia mau para ele, é isso?
— Não quero particularizar. Aquilo que disse sobre a regra da substituição, quando acho que um jogador não esteja a render o que considero ser o ideal, não se aplica ao caso de Katsouranis. Mas esse exemplo deve ser seguido para o futuro.
— Mas falou com ele? Já tinha dito que queria sair...
— Devo dizer que desde o início Katsouranis sempre foi muito responsável, muito frontal. Quando chegou, depois das férias, explicou-me qual era a sua situação, aquilo que pensava e sentia. A posição do clube foi-me comunicada através de Rui Costa. E depois de uma análise ponderada, é sabido que contamos com ele, é um jogador importante. Depois do clássico Katsouranis quis falar comigo... falámos e tivemos uma conversa dura... dura mas franca.
— Em que aspecto?
— Dura... Não é algo negativo, é saudável, mas são coisas que devem ser internas.
— Foi uma conversa difícil...
— Difícil não... dura. Ele teve uma boa atitude em pedir desculpa, mas para mim há certas coisas que quando se repetem já não servem...
— Mas continua a contar com ele para o futuro?
— Sim, claro. Contarei com ele sempre que achar que é necessário.
— E se continuar a querer sair...
— Nós contamos, como contámos, com Katsouranis e assumimos que é um jogador importante. Mas só é importante em determinadas condições. Se respeitar essas condições tudo correrá bem. Foi isso que de início lhe disse a ele e ao clube. As condições sou eu que as defino e ele, com o tempo, terá de as respeitar. Se o fizer, pois continuará connosco... se não respeitar, deixará de estar.
— É verdade que ele lhe disse que preferia não jogar a central?
— Não, isso nunca foi abordado. Vejo Katsouranis como um jogador muito polivalente, com uma certa agressividade, forte na defesa e que sabe sair com a bola controlada e que além disso desempenha várias posições no meio-campo. É um jogador de top, muito semelhante a outro que já orientei no Valência e que também esteve no Benfica: Marchena.
Entrevista de josé manuel delgado, paulo alves e fernando urbano
Estava à espera de encontrar aquilo que encontrou no Benfica? A dimensão do clube, a pressão que existe...
— A percepção inicial era essa. Sabia que o Benfica é o clube maior de Portugal, sabia da sua história. Mas o nível das infra-estruturas confesso que superou as minhas expectativas: são do melhor que há na Europa. É importante que esta dinâmica de crescimento se mantenha e espero poder contribuir.
— Já sentiu que no Benfica existe pressa em fazer as coisas bem?
—Foi um dos desafios que me levou a aceitar o convite. Os clubes grandes têm visão ampla. E quem tem visão ampla não está preocupado só no dia-a-dia, tem projectos com horizontes largos. E isso serve para caminhar em frente. E quando se caminha em frente apanha-se chuva miudinha, que nos dá capacidade para chegarmos ao que queremos. Não gosto de estar à porta das urgências, pois aí todos se precipitam. Um treinador até pode ganhar um título nas urgências, mas se ele sair e chegar outro, sem a mesma planificação, o título anterior não servirá de nada.
Sabia que iria ter um início de campeonato forte. Esperava chegar à segunda jornada com apenas dois pontos?
— Quando começamos um campeonato queremos sempre arrancar bem. Mas o que se faz em dois jogos pode ser muito enganador. Não é o melhor arranque, mas é o arranque normal. O campeonato é uma prova de resistência, não de velocidade.
— Já dissera, ainda antes do início da Liga, que precisava de mais um mês de trabalho...
— Ainda estamos muito longe da equipa que queremos ser. Nestes dois meses mudámos a dinâmica da equipa. Tivemos uma pré-época dura, defrontámos equipas fortes. Por exemplo, a equipa tem uma dinâmica que se perde agora [ausência de muitos jogadores nas selecções] mas estamos a tentar fazer tudo para tornar esta equipa ganhadora. Uma equipa como o Benfica tem de estar habituada a ganhar. Mas para isso é preciso tempo.
— Mas sente que tem condições para lutar pelo título?
— A nossa obrigação é estar o mais alto possível e adeptos devem ter esperanças altas, é o seu papel. Quero uma ambição medida, não desmedida. Toda gente tem ambições, mas mais importante que isso é o projecto, o trabalho, o conhecimento. Queremos procurar títulos, estar na linha da frente, mas a pressão desmedida acaba por ser um contra para os próprios jogadores. Se eles jogam pressionados, com tensão normalmente jogam mal, não acertam três passes seguidos. Não confundir pressão com responsabilidade. Tudo farei para tirar pressão aos jogadores, mas a responsabilidade terá de ser total. Quando assinei fiquei impressionado com o estádio, grande, moderno, capaz e preparado para receber grandes espectáculos e disse ao presidente e ao Rui que o nosso principal objectivo para esta época é alimentar a ilusão, mas para conseguir isso temos de ganhar jogos. E se ganharmos jogos somos candidatos ao título.
— Ajudou a criar projectos no Getafe e no Valência. Mas não os terminou. Aqui gostaria de construir e finalizar o seu projecto?
— Quando uma casa começa a ser construída depressa de mais fico sempre com dúvidas. É preciso saber se as bases estão bem solidificadas, se as paredes estão bem colocadas. No Benfica ainda estamos a trabalhar a base. Nós temos um projecto de dois anos e espero que sejam dois anos que venhamos a recordar como bons e deixar bases sólidas para o futuro.
— E não tem medo de falhar?
— Conheço muita gente no futebol com medo de falhar. Mas eu não tenho, sou sincero. Passei por situações tão difíceis e dramáticas na minha vida pessoal a ponto de ter aprendido a relativizar tudo o que diz respeito ao futebol. Não o considero uma brincadeira, mas relativizo-o. É importante, porque traz felicidade às pessoas, mas é apenas futebol.
— Essa sua forma de pensar contraria a imagem que fazíamos de si: um viciado em trabalho...
— [risos] Podemos trabalhar muito, mas isso não significa que não possamos relativizar o que fazemos. Por isso é que não tenho nem quero ter medo, porque o medo paralisa as pessoas. E se não tenho medo, sou seguro do que faço. A segurança pode custar a obter, mas tenho razões para a ter: primeiro porque tenho um grupo de trabalho excepcional; segundo, porque sinto-me muito preparado para fazer o que faço.
«chateado quando um jogo sai do guião»
— O que faltou para ganhar o jogo com o FC Porto?
— Faltou que ficámos com menos um jogador. Se tivéssemos jogado sempre com 11 jogadores acho que poderíamos ter terminado o jogo como o começámos. Mas circunstâncias várias mudaram o rumo do encontro. Fico muito chateado quando acaba o jogo e percebo que o guião foi muito alterado da nossa parte.
— E o que saiu do guião?
— Estávamos preparados para uma coisa e saímos do nosso guião. Fizemos o 1-1 e sentia que podíamos chegar ao 2-1, mas entretanto deu-se a expulsão e nessa altura tive de mexer na equipa.
— E tirou Cardozo...
— Foi uma das substituições mais dolorosas que tive de fazer na minha carreira, temi que não fosse entendida, mas fiquei contente porque as pessoas perceberam as circunstâncias. Mudei porque estava a ficar com a sensação que íamos sofrer muito com dois avançados.
— A expulsão foi determinante para o aparecimento dos problemas físicos?
— São coisas diferentes, não tem a ver com isso. Porque quando se joga com dez a generosidade aumenta. Quando isso não sucede, é preciso analisar porquê.
— Falou-se muito sobre a questão física. Foi a mudança dos métodos de trabalho que provocou a falta de pernas no 'clássico'?
— Em termos físicos, temos a máxima confiança no trabalho de Pako Ayestarán. É um homem de muita experiência europeia, conseguiu muitos êxitos, leva 20 anos a treinar em clubes de top. Quando analisámos juntos o jogo com o FC Porto, chegámos à conclusão de que duas ou três situações, que entendo devem ser debatidas apenas internamente, provocaram várias reacções em cadeia.
— Quer explicar melhor o que quis dizer quando afirmou que os jogadores não estavam habituados a esta forma de trabalhar?
— Acho que fui mal interpretado, porque não gosto de entrar em comparações com o que outros treinadores fazem. Mas a verdade é que os jogadores têm sido submetidos a uma exigência física muito grande, quer no trabalho diário, quer nos próprios jogos. Porque temos-lhes pedido muita coisa: que tenham boa condição física, boa capacidade de recuperação, capacidade de subir rapidamente à área contrária, fazer pressão... estamos no princípio da época e isto leva tempo.
— A preparação física é baseada consoante o modelo táctico?
— Exigimos que os jogadores tenham uma grande capacidade física. Se queremos manter a defesa um pouco mais alta, significa que os avançados tenham ainda mais capacidade para impedir que a equipa adversária pense quando tem a bola; se queremos atacar sem sermos sujeitos a contra-ataques perigosos e possamos defender 40 metros atrás, teremos de ter uma capacidade de recuperação muito boa. Para isso é preciso ter uma grande preparação física: ter força, velocidade e resistência. Estamos num processo em que o trabalho de Pako não pode ser considerado melhor ou pior: é diferente. Logo os jogadores demoram a adaptar-se.
— Para si, todos os jogadores têm de trabalhar defensivamente?
— Têm de trabalhar. A mecânica de uma equipa é feita em cadeia.
«Reyes pode 'explodir' no Benfica»
— Cardozo e Suazo podem jogar juntos?
— Perfeitamente. No Valência coloquei Villa e Morientes juntos, por exemplo. No meu tempo no Getafe também jogavam dois avançados. Mas há uma coisa que devo dizer: a nossa forma de jogar não é condicionada pelos resultados, a preparação dos nossos jogos é feita de acordo com o que convém à nossa equipa. Mas também temos Nuno Gomes...
— Pode alguma vez jogar com este trio: Cardozo, Nuno Gomes e Suazo?
— É complicado, porque são três avançados que não casam de forma a dois deles poderem jogar à frente e outro atrás deles, ou alguns deles jogarem pelas alas. Dois deles juntos, sim; os três, não. Suazo fará bem a posição de ala, mas não Nuno Gomes ou Cardozo. É muito importante que quando se esquematiza um sistema, que isso se faça pela qualidade dos jogadores.
— O que espera de Reyes no Benfica? Já foi considerado um dos melhores atacantes do Mundo, depois foi caindo.
— Reyes está aqui porque consideramos que é um jogador importante, que pode provocar desequilíbrios. Mas há que ter cuidado especial na gestão do rendimento de determinados jogadores, porque estão numa situação quase limite, que a todo o momento podem rebentar. E isso depende muito da vontade desses jogadores. Não lhes prometemos mais que a outros. A Reyes dei-lhe a entender que no Benfica pode explodir, mas dentro do plano que traçamos, ou seja, que está num bom clube e com uma boa equipa técnica. Mas eu não sou um psicólogo dos jogadores de futebol. Sou um treinador que deve gerir parte das emoções mas não a partir do momento em que estes vão em direcção contrária. Porque quando isso acontece eles transformam-se em estátuas de pedra. Portanto, no caso dos jogadores que eu pedi, como Reyes, penso sempre positivo: que são jogadores talentosos, com oportunidade de explodirem e, se o fizerem, são jogadores de nível superior.
— E está com alegria a trabalhar?
— Sim. Só trabalhou connosco duas semanas antes do jogo com o FC Porto. Gostei da forma como entrou com o Inter e fez um bom jogo com o FC Porto. Não tanto pelo desequilíbrio, porque era um jogo difícil, mas analisando o jogo posteriormente chega-se à conclusão que ele se esforçou muito. E nós sabemos o que ele fez nos últimos anos. Por isso acho que foi um bom começo para ele. Mas se achar que o que ele fez é suficiente, é um erro. Deve continuar a trabalhar o seu sistema emocional para recuperar a sua confiança como jogador, à semelhança de Suazo, pois ambos vivem situações semelhantes.
— Disse um dia que Aimar é um jogador «mais para decidir jogadas do que jogos». É assim que o continua a ver?
— Na altura disse isso quando me pediram para o comparar a Riquelme. Sobre Aimar recordo os bons tempos que passámos no Valência. Fez uma espectacular dupla de ataque com Villa. Pensa muito rápido e raramente se engana. Porque há muitos jogadores que pensam rápido mas que se enganam muito.
— Ele ainda não mostrou o seu verdadeiro valor?
- Ainda não houve tempo para se ver o verdadeiro potencial de todos os jogadores do Benfica. Há uma grande curiosidade em ver o que fazem estes jogadores novos. Se eu fosse adepto, todos os jogadores ainda estariam por descobrir. Há coisas que os jogadores vão mostrando pouco a pouco, mas eles ainda estão muito longe de fazer aquilo que podem fazer mais para a frente.
— Aimar precisa de um trabalho específico, tendo em conta o seu passado de lesões?
— Com Aimar é preciso haver alguma delicadeza, pois tem um historial diferente de outros. Mas há que lembrar isto: ele nunca teve problemas físicos connosco no Valência e existe uma confiança enorme de que o melhor Aimar viu-se nos tempos em que trabalhou com Pako Ayestaran. Aimar estará em boas condições para nos ajudar a ganhar muitos jogos.
— Em que posições pode ele jogar?
— Como médio, segundo avançado (como o tem feito no Benfica) ou jogando nas alas.
A— Na sua cabeça conta com o avançado Di María?
— Sim, claro. Creio que seria muito mau para o Benfica, para a equipa, se assim não fosse.
— A questão é que só podem jogar 11: não terá problemas com jogadores que não aceitem o banco?
— Nunca tive problemas em relação a isso. Para mim não é nenhum drama ter de fazer a convocatória ou escolher o onze. E não é nenhum drama porque essa é a minha profissão. Não digo que ocasionalmente não tenha dúvidas, mas isso é normal. Não me esqueço dos jogadores que não convoco e preocupo-me com eles, mas tenha a consciência tranquila quando faço a equipa.
— Não foi arriscado colocar Di María no clássico, pois tinha trabalhado pouco tempo consigo?
— Foi uma tentativa de aproveitar uma dinâmica positiva. Trata-se de um jogador que acabou de ganhar uma medalha de ouro nos olímpicos, era um jogador que vinha muito motivado e tínhamos que aproveitar isso. Além disso, é um jogador que já conhece bem o Benfica e o ambiente nestes grandes jogos.
— Os colossos europeus descobriram de repente Di María, sendo ele um jogador muito novo não afectará a sua cabeça?
— Creio que não. Ele está com a cabeça no Benfica e sabe que é esta equipa constitui uma forma de ter maior visibilidade na Europa. Ele saberá como agir quando tiver ofertas e o melhor para ele neste momento é seguir no Benfica.
— Saiu Petit, que era um dos históricos. Na época passada saiu Simão. Quem pode ser o líder do balneário agora?
— Eu prefiro ter líderes dentro de campo do que líderes no balneário. Conheci poucos líderes de balneário na minha carreira de jogador. Lembro-me de alguns no Real Madrid, como Hierro, Sanchis, Butrageño, Michel, mas não existia essa liderança espectacular no balneário como as pessoas pensam. Não acredito muito nisso, essa liderança reduz-se a casos muito particulares como foi o caso de Beckenbauer, Bobby Charlton, jogadores que tinham uma grande personalidade. Gosto, isso, sim, dos jogadores com forte personalidade quando entram no relvado, que tenham a capacidade de resolver as situações. Porque no balneário podemos ser todos muito educados ou mal-educados, mas essa situação cabe aos treinador analisar. Mas no campo não posso fazer nada: tenho um limite, ficamos no outro lado da fronteira e quem resolve os jogos são os jogadores. E aí é que surgem os líderes.
— E quem pode ser esse líder no campo?
— Ainda é muito cedo para dizer. Luís Aragonés diz isto há muitos anos: «Não quero ter um líder, antes quatro ou cinco 'corredores de segurança' dentro de campo.» Concordo totalmente.
— Mas gosta de ter um jogador que seja a extensão do treinador dentro do campo?
— Sim. Às vezes não dá para falar com quatro ou cinco jogadores ao mesmo tempo e esse elemento é fundamental numa equipa. Mas que aparece de uma forma muito natural. No Valência, tinha Ayala.
— A liderança no campo pode ser dissociada da liderança no balneário? Como é que um jogador dá instruções a outro se não tiver moral junto do colega?
— A nível de sistema de jogo, todos são novos. Todos partem do zero! Mas há jogadores que começam a perceber mais rapidamente o método e ter influência junto dos colegas. Não gosto de particularizar, mas tenho de dizer que Luisão está a entender bem a nossa metodologia e que de alguma forma está a colaborar muito para que as coisas se encaixem. Não é pelo facto de ser o capitão na ausência de Nuno Gomes, mas pelo facto de ter uma visão panorâmica lá atrás, na defesa, podendo ver o que está a ser bem ou mal feito.
«Nem sempre se ganha jogando bem»
— O seu futebol é de ataque?
— O meu futebol é de uma visão ampla. As minhas equipas tanto jogam mais atrás como mais à frente. Há seis anos que treino e posso dizer que em cada época, apenas um ou dois jogos me surpreende relativamente ao que espero das minhas equipas. A minha forma de estar no futebol é esta: não ter surpresas. Quero que no final da época, e depois de 60 jogos, os jogadores pensem: «jogámos tal como o treinador nos pediu.» Isso é muito importante. Quanto ao futebol mais ofensivo ou não, depende muito dos jogadores.
— Quem joga bem está mais perto de ganhar?
— Não. Quem tem bons jogadores está perto de jogar bem. Mas nem sempre se ganha jogando bem.
— Mas muitas vezes ouvimos os treinadores queixarem-se do azar, quando o dever das suas equipas é jogar bem...
— Sou mais apologista desta ideia: quanto mais trabalhas, mais êxito tens. Porque isso da sorte ou azar... isso não. Trabalho e sorte é um casamento muito feliz mas...
— Quer as suas equipas a jogar sempre com dois médios centro?
— Tenho uma visão ampla. Não condiciona o equilíbrio da equipa se tivermos um jogador a actuar atrás de dois avançados; ou se tivermos apenas dois médios-centro; ou apenas um médio-centro e quatro jogadores mais à sua frente, como fez a selecção espanhola.
— No futuro poderá fazer alterações tácticas ou este sistema é para manter?
— Quando se está a criar um menino (e esta analogia aplica-se ao trabalho que estamos a fazer no Benfica) não se pode mudar muita coisa antes de saber se ele será bonito, feio, louro ou moreno. Por isso, há que aperfeiçoar um sistema para posteriormente trabalhar as suas variantes. Queremos ter segurança nesse trabalho, pois a partir daí poderemos trabalhar os mesmos movimentos, mas vários metros à frente ou atrás.
— A qualidade do futebol é muito diferente de Espanha para Portugal?
— Sobretudo a nível dos recursos. Os clubes médios em Espanha subiram muito nos últimos anos, têm orçamentos muito elevados e isso creio que é o que faz a diferença entre as duas ligas. Daí o futebol ter depois maior competitividade, porque qualquer equipa pode perder em qualquer estádio.
«David Luiz tem nível mundial»
O treinador espanhol vê grande futuro para o central, mas, para já, prioridade à recuperação
— David Luiz: o que se passa com ele?
— Está há muitos meses sem jogar, e quando isso acontece os jogadores 'oxidam'. É normal neste tipo de processo. E a oxidação num futebolista não é fácil de recuperar. É verdade que vejo muitas qualidades no David, incluindo a capacidade de sofrimento, pois, por vezes, treina-se com dor. Em condições será um jogador capaz de atingir um nível muito alto, a nível mundial, um dos melhores centrais da Europa. Mas primeiro temos de lhe retirar essa oxidação, que lhe afecta desde a parte muscular até à parte psicológica.
— Quando pode voltar?
— Não sabemos. Esta semana mudámos a dinâmica de forma a ajudá-lo da melhor maneira possível a ultrapassar esta fase.
«Satisfeito com Diamantino»
Diamantino e Chalana têm, garante, papel fundamental na estrutura da equipa
— Muito se tem falado de Diamantino e Chalana. Quais são, na realidade, as suas funções?
— Quando chegámos, aquilo que dissemos é que cada um tivesse lugar num posto onde fosse mais eficaz, pois além do trabalho de campo há muitas outras coisas a ter em atenção. E os resultados daquilo que têm feito deixam-me muito satisfeito, tanto ou mais como o trabalho de campo.
— Mas fica ou não 'enfadado' quando vê que um adjunto se senta na tribuna presidencial ao lado do director-geral?
— Eu não perco tempo a analisar esse tipo de coisas. São fruto da especulação jornalística. Durante os jogos concentro-me apenas no que se passa no relvado e em como posso ajudar a equipa, nada mais... Não valorizo essas situações.
Sidnei
— Quando entrou com o FC Porto não se equivocou e marcou na linha, que é o que pedimos aos defesas. Ficámos com muito boa impressão. Estes jovens têm de saber fazer a leitura do que é chegar a um clube como o Benfica e esperar pela sua oportunidade e estar preparados. Mesmo que não jogue, é importante que esteja preparado.
Luisão
— Ainda não sei se vamos poder contar com ele para os próximos jogos da Liga. Este castigo é uma situação estranha, sancionar um jogador pelas imagens... lances como aquele em que esteve envolvido, na marcação de um canto, acontecem todos os jogos, em plena área, é uma situação constante. Mas resulta mais estranha quando verificamos que outro tipo de imagens não foi transmitido, no caso o episódio entre Rodriguez e Nuno Gomes. Esta semana um jogador nosso falou que tinha sido uma discussão normal em futebol? Isso está certo! A discussão a seguir à agressão é normal... o que não é normal é a agressão que a antecede.
Zoro
— Não entrava nas minhas contas. É verdade e nunca o escondi, mas como não foi possível resolver a sua situação foi reintegrado. Quero o melhor para ele e o facto de não ser opção aqui, não significa que não possa ser feliz em outro clube. Neste momento está reintegrado e vai continuar a trabalhar.
Mantorras
— Está num processo em que tem de melhorar a sua condição física. Esteve também muito tempo parado, teve uma lesão muito grave. Quando estiver bem, faremos uma reavaliação. Temos de respeitá-lo enquanto pessoa, que teve um grande infortúnio, e recuperá-lo para a competição.
Nuno Gomes
— Contamos com ele. No Verão falou-se e escreveu-se que ele podia sair, mas em nenhum momento esteve fora dos nossos planos. Nuno é muito participativo em tudo. Por exemplo, durante o estágio em Óbidos, quando fomos atravessar o rio nas jangadas ele foi dos que tiveram maior intervenção na construção da jangada. Expôs a sua magnitude sendo o primeiro a avançar para o desafio. Como jogador também é assim.
Katsouranis
Quique assume «conversa dura mas franca» com o grego após o clássico. Conta com o jogador, mas admite deixá-lo sair se este quebrar as regras
Katsouranis teve dois erros individuais no clássico e é público que não se sente feliz. Acha que o seu subconsciente o terá traído?
— Sem falar no caso concreto de Katsouranis, conto o que aconteceu comigo no Valência: quando eu sentia que um jogador não estava bem mental ou fisicamente, aplicávamos a regra da substituição. Mas isto não se aplica a Katsouranis.
— Se ele jogou, é porque sentia que estava bem física e mentalmente?
— Nós só queremos jogadores que queiram defender as cores do Benfica, que quando entrem em campo se apresentem no limite das suas capacidades. Se há limitações, assumimos, mas aí o erro será do treinador.
— Foi apenas um dia mau para ele, é isso?
— Não quero particularizar. Aquilo que disse sobre a regra da substituição, quando acho que um jogador não esteja a render o que considero ser o ideal, não se aplica ao caso de Katsouranis. Mas esse exemplo deve ser seguido para o futuro.
— Mas falou com ele? Já tinha dito que queria sair...
— Devo dizer que desde o início Katsouranis sempre foi muito responsável, muito frontal. Quando chegou, depois das férias, explicou-me qual era a sua situação, aquilo que pensava e sentia. A posição do clube foi-me comunicada através de Rui Costa. E depois de uma análise ponderada, é sabido que contamos com ele, é um jogador importante. Depois do clássico Katsouranis quis falar comigo... falámos e tivemos uma conversa dura... dura mas franca.
— Em que aspecto?
— Dura... Não é algo negativo, é saudável, mas são coisas que devem ser internas.
— Foi uma conversa difícil...
— Difícil não... dura. Ele teve uma boa atitude em pedir desculpa, mas para mim há certas coisas que quando se repetem já não servem...
— Mas continua a contar com ele para o futuro?
— Sim, claro. Contarei com ele sempre que achar que é necessário.
— E se continuar a querer sair...
— Nós contamos, como contámos, com Katsouranis e assumimos que é um jogador importante. Mas só é importante em determinadas condições. Se respeitar essas condições tudo correrá bem. Foi isso que de início lhe disse a ele e ao clube. As condições sou eu que as defino e ele, com o tempo, terá de as respeitar. Se o fizer, pois continuará connosco... se não respeitar, deixará de estar.
— É verdade que ele lhe disse que preferia não jogar a central?
— Não, isso nunca foi abordado. Vejo Katsouranis como um jogador muito polivalente, com uma certa agressividade, forte na defesa e que sabe sair com a bola controlada e que além disso desempenha várias posições no meio-campo. É um jogador de top, muito semelhante a outro que já orientei no Valência e que também esteve no Benfica: Marchena.
Etiquetas: treinador
posted by J G at 10:00 da manhã
4 Comentários:
Exigimos que os jogadores tenham uma grande capacidade física. Se queremos manter a defesa um pouco mais alta, significa que os avançados tenham ainda mais capacidade para impedir que a equipa adversária pense quando tem a bola; se queremos atacar sem sermos sujeitos a contra-ataques perigosos e possamos defender 40 metros atrás, teremos de ter uma capacidade de recuperação muito boa. Para isso é preciso ter uma grande preparação física: ter força, velocidade e resistência.
-Advinham-se tempos difíceis para Cardozo! A chegada do Suazo, a sua (i)mobilidade posicional em campo e a falta de dinâmica defensiva como o 1º dos defesas retiram-lhe margem para ser titular! O jogo com o Porto foi um aviso...
, at -Advinham-se tempos difíceis para Cardozo! A chegada do Suazo, a sua (i)mobilidade posicional em campo e a falta de dinâmica defensiva como o 1º dos defesas retiram-lhe margem para ser titular! O jogo com o Porto foi um aviso...
e o noxo liverpool la soma e segue! desta vez foi a equipazinha do menino ;) go liver go liver go!
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Eu não avisei no primeiro comentário que o Cardozo não irá ter vida fácil?
Parece que sou bruxo!
, at Parece que sou bruxo!
Aquela do Luisão ser importante "lá atrás para ter uma boa panorâmica" é um achado. Há ali declarações que me parecem desajustadas mas enfim....Já no fim do jogo com o Rio-Ave e no outro com os Corruptos o gajo parecia que tinha sido atropelado por um camião TIR e teve um discurso inseguro e errático.Ainda há muito treino pela frente.Parece-me muito inflexível no esquema táctico e depois quando é necessário agir e fazer substituições forçadas pelo decorrer do jogo o tipo anda ali a "patinar".
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