sexta-feira, 25 de julho de 2008
A VERDADE (de uma vez por todas)
UMA MENTIRA REPETIDA MUITAS VEZES
Em cerca de trinta anos de adepto de futebol nunca tinha ouvido tal coisa, e foi preciso aparecerem uns iluminados, fanatizados e instrumentalizados por um certo poder, para ver lançada no ar essa atoarda, como se se tratasse da mais cristalina das evidências.
A afirmação é tão absurda que não mereceria mais que o silêncio. Mas ainda assim, não gostaria de perder a oportunidade de deixar aqui algumas notas, para que os mais novos não se deixem enganar, e a partir das quais se pode ver o ridículo em que caem aqueles que, por fraqueza de espírito, ingenuidade ou ignorância, se deixam manipular e fanatizar por quem deles se serve e assim perpetua um poder bem mais absoluto do que devia, e para o qual a ética e a justiça estão, não na ponta da espingarda como diria Mao-Tse-Tung, mas sim numa qualquer comemoração triunfante na Alameda das Antas. Vejamos:
1 - Será o menos importante, mas para começar, a cor vermelha diz bastante. Salazar, que nem sequer gostava de futebol, nunca patrocinaria um clube com as cores da sua figadal inimiga União Soviética. A comunicação social até foi forçada a utilizar a palavra “encarnados” para descrever o Benfica, de modo a não conjugar “vermelhos” com “vencedores”, o que poderia ser dramático para o regime. Ao contrário do Real Madrid – que usava cores queridas aos falangistas de Franco -, o Benfica usava as cores da revolta. Diria até que, por exemplo, o azul e o branco ficariam esteticamente bem melhor com toda a simbologia salazarista.
2 - O Estado Novo teve início em 1926 e começou a desintegrar-se em 1961 com as crises estudantis e a guerra colonial. Pois foi precisamente na fase decadente do antigo regime que o Benfica emergiu como força dominante do desporto português.
Nos primeiros vinte e cinco campeonatos nacionais (entre 1934 e 1959, ou seja o período mais relevante do Salazarismo), a lista de vencedores é encabeçada pelo Sporting com 10 títulos, seguindo-se o Benfica com 9, o F.C.Porto com 5 e o Belenenses com 1. O Benfica tinha portanto vencido 36 % dos campeonatos – em 2008 tem 42%...
3 - O 25 de Abril foi, como todos sabem, em 1974. Pois nas três épocas seguintes o Benfica foi tri-campeão !. Nos vinte anos a seguir à revolução o clube da Luz, não parecendo sentir nada o fim da ditadura, venceu 10 campeonatos, 7 taças, e foi a 3 finais europeias. No mesmo período o F.C.Porto conquistou 8 campeonatos, 5 taças e foi a 2 finais europeias. O Sporting venceu 2 campeonatos e 2 taças.
A crise benfiquista, e a consequente hegemonia portista, deu-se apenas devido às sucessivas má gestões de Jorge de Brito (neste caso mais de quem o acompanhava), e sobretudo, Manuel Damásio e Vale e Azevedo que, paralelamente a outros aspectos, abriram campo aos triunfos portistas das últimas decadas.
4 - Por falar em presidentes, o Benfica foi ao longo da sua história, e enquanto durou o regime anterior, quase sempre presidido por ilustres oposicionistas. Félix Bermudes foi perseguido pela PIDE, e no consolado de Tamagnini Barbosa o clube chegou a correr o risco de ser encerrado pelo governo por alegadamente estar tomado por “conspiradores”. Um outro presidente (Júlio Ribeiro da Costa) teve mesmo de se demitir para que o clube não fosse mais penalizado pelo regime, dada a sua forte conotação política com a oposição. O Benfica chegou a ter um presidente operário (Manuel Afonso, também, naturalmente, oposicionista), e foi, de longe, o clube desportivo que mais problemas criou a Salazar, como de resto seria de esperar numa agremiação tão marcadamente popular desde a sua fundação.
5 - Os órgãos sociais do Benfica sempre foram eleitos democraticamente, o que por diversas vezes foi alvo do olhar recriminador da PIDE, que acompanhou os actos eleitorais e assembleias-gerais bem de perto. Durante muitos anos foi o Benfica a única das grandes instituições do país onde o poder era escolhido através de voto livre e democrático. Nem o Jornal do clube escapou à perseguição, sobretudo quando tinha à sua frente José Magalhães Godinho.
6 - Os poderes públicos apoiavam tanto os “encarnados” que em 1956 escolheram o Sporting – por convite - para participar na primeira edição da Taça dos Campeões Europeus, apesar do campeão da época anterior ter sido o Benfica.
7 - O Estádio das Antas, construído com fortíssima ajuda do regime, e financiado por gente a ele ligada, foi inaugurado num dia 28 de Maio, data em que Gomes da Costa havia partido do norte em direcção a Lisboa para instalar a ditadura em Portugal, 26 anos antes. Curiosamente, o Benfica estragou a festa e venceu por…2-8 !!
Pelo contrário, o Estádio da Luz foi construído (muitas vezes literalmente) pelos sócios do Benfica, sem recurso a quaisquer subsídios, e permitiu ao clube acabar com os sucessivos despejos a que foi sujeito e a que foi estoicamente resistindo. Curiosamente, o estádio que o Benfica utilizava antes tinha sido arrendado pelo Sporting (clube da aristocracia lisboeta), que então lhe chamava Estádio 28 de Maio. O Benfica não só fez questão de o inaugurar num dia 5 de Outubro, como lhe mudou o nome, designando-o apenas por “Campo Grande”.
8 - No início dos anos quarenta, época dourada de Salazar, o F.C.Porto beneficiou da ajuda dos seus influentes homens do poder para, através de dois cirúrgicos alargamentos, evitar cair para a segunda divisão, após se ter classificado em terceiro lugar no seu campeonato regional, que na altura apurava as equipas (os dois primeiros) para a prova nacional. Mal se sabia que, décadas e décadas depois, seria novamente a sua influência a evitar a descida, agora por motivos bem diferentes, e bem mais nebulosos.
9 - Como referiu Manuel Alegre – insuspeito de salazarismo – os relatos dos jogos do Benfica, e as suas vitórias, eram motivo de grande regozijo entre os exilados políticos. O Benfica era mesmo, para alguns deles, o único motivo de orgulho no seu país.
10 - O Benfica foi campeão europeu com jogadores que faziam parte dos movimentos de libertação das colónias, como Santana e Coluna. Obviamente que Salazar não teve alternativa senão engolir o sapo e colar-se ao êxito do clube, aproveitando-se dele para efeitos políticos.
11 - Nas comemorações da vitória aliada na segunda guerra mundial, toleradas por Salazar apenas por receio de represálias dos vencedores – sobretudo a tradicional aliada Inglaterra – viram-se nas ruas bandeiras de França, dos Estados Unidos, de Inglaterra e…do Benfica, estas naturalmente substituindo as da URSS, e utilizadas por oposicionistas comunistas.
12 – O hino do Benfica (“Ser Benfiquista”) cantado por Luís Piçarra não é o original do clube. O primeiro hino, composto por Félix Bermudes, chamava-se “Avante Benfica” e foi silenciado pelo regime.
13 – O Estádio da Luz passou 17 anos, desde a sua fundação, sem ser utilizado pela selecção nacional. Só já nos anos setenta se disputou o primeiro jogo de Portugal num estádio benfiquista. Nunca se jogou a final da taça na Luz ou em qualquer outro estádio utilizado pelo Benfica, ao contrário do que aconteceu nas Antas, onde o F.C.Porto disputou (em casa) nada menos que três finais, antes e depois do 25 de Abril.
14 - O primeiro grande escândalo de arbitragem na história do futebol português valeu um título ao F.C.Porto. Estávamos em 1939, no auge da ditadura salazarista, e no jogo decisivo os “vermelhos” viram um golo anulado nos últimos instantes, que valeria a vitória e o título. Também a história Calabote (que foi irradiado) está mal contada – e em breve poderei falar dela -, e de resto redundou num outro título para o F.C.Porto, que aliás já na altura demonstrava uma propensão enorme para se envolver em questões desta natureza.
15 – Ao longo dos anos do regime ditatorial, as situações em que os poderes públicos e federativos prejudicaram o Benfica administrativamente sucederam-se. Uma das mais conhecidas foi a não autorização para adiar o jogo da Taça de Portugal frente ao V.Setúbal, marcado para o dia seguinte à final de Amsterdão em 1962. Mas houve outras, como a marcação da repetição de um jogo para três dias antes da tal jornada de Calabote, obrigando o Benfica a um desgaste adicional que lhe poderá ter custado o título.
16 – Nunca em tempo algum o Benfica teve um seu sócio, ou mesmo adepto, como presidente de organismos ligados à arbitragem do futebol. O F.C.Porto é o que se sabe, e o Sporting também não se pode queixar pois tem agora lá um “emblema de ouro”.
17 - O Benfica conquistou mais títulos nacionais nas modalidades extra-futebol em democracia (57), do que em ditadura (44). Ao contrário, por exemplo, do F.C.Porto, que à excepção do caso específico do hóquei em patins, tem mais títulos antes da revolução de Abril do que depois (25 antes -19 depois).
18 - O Benfica tem entre os seus adeptos gente de todos os estratos sociais e sectores políticos. Mas convenhamos que Álvaro Cunhal, José Saramago, Xanana Gusmão, António Guterres, Jerónimo de Sousa, António Vitorino de Almeida, Artur Semedo, Manuel Alegre, Miguel Portas e muitas outras figuras da esquerda portuguesa, simpatize-se mais ou menos com elas, nunca seriam seguramente adeptos de um clube de algum modo relacionado com o regime fascista.
19 – É curioso que o Benfica, tendo adeptos espalhados pelo país e pelo mundo, tem maior expressividade precisamente nas zonas mais conhecidas pelo seu combate ao fascismo, ou seja Alentejo – onde a percentagem de benfiquistas é absolutamente esmagadora - e cintura industrial de Lisboa, nomeadamente a margem sul do Tejo. Pelo contrário, o F.C.Porto tem a grande maioria dos seus adeptos concentrados na região norte, pouco conhecida pelo combate democrático – pode ser injusto para muitos dizê-lo, mas a verdade é que a maioria dos agentes da PIDE eram nortenhos, e a maioria dos detidos eram provenientes justamente das zonas onde existe maior expressão do benfiquismo.
Nos anos quentes da reforma agrária, no pós-revolução, sei de pessoal das UCP’s alentejanas que se organizava em excursões para os jogos internacionais do Benfica.
20 – Seria interessante também fazer a contabilidade dos adeptos e sócios do Benfica nas ex-colónias. Como seria possível haver tantos benfiquistas, por exemplo, em Angola e Moçambique, se o clube tivesse alguma conotação com o regime que durante anos lhes negou a independência e lhes deu a guerra ?
Etiquetas: clube
9 Comentários:
Aproveito para desejar boas férias. Eu ainda aguarda pelas minhas 3 semanas, a partir de 8 de Agosto. Aguenta coração hehe.
Abraço.
Contudo ha uma outra mentira que querem tornar verdade e que para mim consegue ser tão ou mais de má fé: afirma-se á boca cheia (aliás é quase unanime no norte e na imprensa) que a hegemonia do fcp teve inicio na decada de 80. Ora bem consultando o historico dos campeonatos constatamos que na decada de 80 o SLB arrebatou 5 campeonatos e 5 Taças (seriam 6 se considerassemos a epoca de 79/80, mas esta ja a dou de desbarato) contra 4 campeonatos tripeiros e (pasmem-se) 2 taças de portugal!!
Alguem me explique o significado de hegemonia porque entretanto fiquei confuso
Aproveito também para acrescentar o seguinte.
Só em Português é que existem duas palavras para designar a cor vermelha, encarnado e vermelho.
O antigo regime proibia que se dissesse a palavra "vermelho" por ser conotada com o PCP.
Daí dizer-se "encarnado".
E o escritor António Lobo Antunes conta quer quando lhe perguntam, quer num dos seus livros que, na guerra colonial, quando existiam combates e existia ao mesmo tempo um jogo de futebol do Benfica, ambos os lados paravam, durante duas horas, de combater.
Para ouvirem o relato do jogo.
Não pareavam de combater quando o Porto ou o Sporting jogavam.
Lobo Antunes diz que é por isso que é do Benfica, que só o Benfica conseguía parar a guerra.
E Lobo Antunes esteve na Guerra como oficial miliciano.
Conhece as coisas em primeira mão.
Quanto à questão aqui levantada da hegemonia do porto ter supostamente começado na década de 80, é outra que me irrita solenemente.
Até porque, Constantino, o porto não venceu 4 campeonatos na década de 80. Venceu apenas 2 (84/85 e 85/86), porventura 3 se somarmos o de 89/90.
Se quisermos ser honestos, deve-se dizer que o Benfica dominou esmagadoramente o futebol português de 1960 a 1985, seguido de um período de domínio bipartido de forma practicamente igualitária entre porto e Benfica de 1985 a 1994, ao que se seguiu a hegemonia azul e branca evidente que se vive até aos dias de hoje.
Claro que este domínio portista deverá sempre ser visto no futuro com um famoso, por outros motivos, asterisco, que explicitará uma "hegemonia conquistada através e altamente auxiliado por métodos corruptos.
De qualquer maneira, o fundamental mantém-se: o porto não dominou, nem nada que se pareça, a década de 80.
Cumps
Nos últimos 3 anos o Benfica ficou por 2 vezes em 3º lugar e no ano passado ficou em 4º lugar.
Para quem ainda anda iludido, a leitura fria do que se tem passado nos últimos 3 anos é só uma: o Benfica está longe da liderança do futebol português.
O Porto assumiu, há muito, o domínio do nosso futebol, por muito que nos custe admitir. O Porto é tri-campeão nacional e parte claramente favorito para este ano alcançar o tetra.
O Sporting, que tem andado sempre muito calado, tem levado a água ao seu moinho, conseguindo entrar sempre na Liga dos campeões. Há muito que o Sporting desistiu dos resultados desportivos tendo-se concentrado em tentar resolver a sua delicada situação financeira.
Para isso, o Sporting precisa de estar na Liga dos Campeões, o que tem conseguido através dos seus segundos lugares e vai entretendo os seus adeptos com as vitórias na Taça de Portugal.
No entanto, como na próxima época apenas o campeão entrará directamente na Liga dos Campeões, talvez isso possa fazer com que finalmente os seus dirigentes tenham que sair da toca.
E o Benfica?
O Benfica tem um problema grave. Ainda não percebeu nada do que se passa à sua volta. O Benfica é um clube sem uma linha de rumo definida e clara. O Benfica é um clube que vive das conquistas passadas e de um discurso inflamado e irrealista para animar a sua massa associativa.
Estamos no verão.
Esta é normalmente a época mais feliz para o nosso clube. É o momento de todas as ilusões e onde todos os sonhos nos são permitidos.
No ano passado, mais ou menos por esta altura, o nosso presidente anunciava aos sete ventos que o Benfica tinha o melhor plantel dos últimos 10 anos. Essa confiança tinha por base um investimento (?) num montante superior a 30 milhões de euros na compra dos seguintes jogadores: Cardozo, Andrés Diaz, Luís Filipe, Stretenovic, Bergessio, Freddy Adu, Fábio Coentrão, Butt, Di Maria, Maxi Pereira, Edcarlos, Binya e o emprestado Cristian Rodriguez (a que vieram juntar-se mais tarde Sepsi e Makukula por mais alguns euros).
O problema é que mal a bola começou a rolar os sonhos começaram a ruir. Fernando Santos foi despedido no final da 1ª jornada. Veio depois Camacho e com ele mais um novo ciclo. Camacho foi embora (quando ia em 2º lugar) e a equipa ficou à deriva nas mãos de um Chalana atarantado tendo acabado em 4º lugar.
Mas não faz mal. Estamos todos preparados para mais um novo ciclo e mais alegrias de verão.
No entanto, o que eu continuo sem ver é uma estratégia ou uma linha de rumo.
Ou melhor, a estratégia está à vista e fácil de decifrar. O Benfica tenta, por todos os meios, aniquilar Pinto da Costa. Talvez pensemos todos que o caminho mais fácil para as vitórias é tirar Pinto da Costa do futebol. O melhor seria o homem talvez nem ter nascido. Ou nascido benfiquista (já imaginaram?).
A esta altura, está vendida a ideia a todos os benfiquistas que o Porto só ganhou à custa da batotice de Pinto da Costa. Com Pinto da Costa o Porto foi campeão 15 vezes (tendo conseguido ganhar 5 campeonatos seguidos), foi 2 vezes campeão europeu, venceu 2 Taças Intercontinentais, ganhou uma Taça UEFA e uma Supertaça Europeia. Que grande batoteiro este Pinto da Costa !!! Não sei qual será a quantidade de fruta necessária para tantas vitórias, mas deverá dar para abastecer a rede de hipermercados Modelo-Continente durante uns anos!
É pena os nossos batoteiros (também devemos ter tido alguns ou foram todos uns anjinhos inocentes?) não terem tido a qualidade da batota de Pinto da Costa.
Hoje em dia, conscientes que não somos capazes de os vencer em campo, vibramos a cada recurso ou cada papel que os nossos advogados entregam na UEFA, no Tribunal Arbitral do Desporto ou noutra instância qualquer.
Ao que chegamos! É uma tristeza. O que eu gostaria de ver era o meu presidente a construir equipas que derrotassem o Porto, Pinto da Costa, e todos os outros, em campo, com golos, que nos desse títulos nacionais e europeus. Eu não quero vitórias em tribunais. Quero vitórias em campo!
Enfim, numa coisa estamos todo de acordo: nada melhor que o verão. A bola ainda está parada e novos jogadores chegam todos os dias ou estão quase a chegar. Talvez este ano o nosso presidente anuncie que esta será a melhor equipa dos últimos 20.
Mas ainda temos a cereja no topo do bolo: podemos todos dizer mal de Pinto da Costa. Podemos dormir descansados, afinal foi tudo batota. Para se ser popular no Benfica nada melhor que nos atirarmos às canetas de Pinto da Costa. Não era essa também a estratégia de Vale e Azevedo? Desta vez ele não vai escapar.
Vivemos dias felizes.
É só pena não estarmos a fazer nada a sério para construir um Benfica ganhador.
Mas não faz mal. No próximo ano voltará a haver verão!!!