Encarnado e Branco

TVGolo.com - Novos Golos

quarta-feira, 29 de novembro de 2006

O Derby

Em vésperas de visitar Alvalade recupero uma prosa que publiquei em Janeiro do ano passado sobre o derby no Terceiro Anel que hoje aqui recupero:

Do que falamos quando dizemos que um determinado encontro é muito mais do que um simples jogo de futebol?
Em Alvalade a Festa sabe melhorFalamos de jogos muito especiais que envolvem um ambiente muito próprio que se traduz em emoções fortes. Para que isso aconteça é preciso que seja um jogo decisivo, ou de uma fase avançada de uma importante competição ou que seja um econtro entre dois rivais históricos.
Aqui fala-se da visão encarnada sobre o derby lisboeta, Benfica-Sporting. Há várias categorias de derbys, a saber:
A - receber o rival em casa;
B - jogar com o rival em campo neutro;
C - ir à toca do rival.

Podia desenvolver teorias para cada uma das categorias, mas vou ficar pela afirmação que é a categoria C a que mais mexe com a minha alma benfiquista. São várias as razões, a mais compreensível é que não há sensação melhor do que derrotar o Sporting no seu próprio estádio. Mas para que tudo isto faça sentido é preciso obedecer à condição de estar lá presente. Ver o jogo pela televisão retira a parte mais emocionante. Gritar golo num café, ou em casa não é mesma coisa do que festejar loucamente um golo na cara de 50 mil lagartos.
Lagartos, sim! Para nós, os adeptos do Sporting nunca são leoninos ou sportinguistas, são lagartos. Depois há variações conforme a pessoa em causa. Lagarto é o comum mortal que se assume sportinguista, lagartão é aquele que abraça a sua causa com tanta paixão como eu abraço a minha causa benfiquista, lagartixa é aquele que desprezamos, lag é o diminuitivo "carinhoso" com que tratamos os nossos amigos mais chegados.
Isto faz sentido explicar, porque apesar desta rivalidade imensa é preciso ter a sorte que eu tenho tido, e saber fazer desta relação "odiosa" grandes laços de amizade. Afirmo aqui com orgulho que entre os meus melhores amigos estão lags que muito estimo e que fazem com esta rivalidade seja cada vez mais acesa.

Ultimamente tenho tido oportunidade de conhecer melhor amigos que vivem fora da minha área e que habitam bem a norte do país, tanto benfiquistas como lagartos. Cheguei à conclusão que uns e outros encaram estes derbys de maneira ligeiramente diferente da minha. É comum ter este tipo de desabafo com um benfiquista do norte: "Então, lá vamos ter de ir a Alvalade lixar os gajos..." e a resposta estranha-se: "Pá, isso não é muito importante, o que interessa é que o Benfica venha cá ganhar ao Dragão!". Isto é espantoso! Só mesmo pela geografia se pode entender este pensamento. Não há nada mais importante do que derrotar o nosso rival e vizinho!
Quem vive o futebol há muitos anos como eu vivo, sabe que a rivalidade com os verdes é um sentimento omnipresente, todo o ano, todos os dias. Estar em contacto com lagartos faz com que estejamos sempre a picar e a agoirar.
Isto é assunto sério. A mim ninguém me tira da cabeça que esta seca que o meu clube atravessa é um merecido castigo por tudo o que fiz sofrer aos meus colegas lagartitos (mais outra expressão bonita) durante a fase escolar, da primária ao fim do liceu. Foram anos e anos de massacre. Um gajo habitua-se aquilo , ano após ano a ver o rival sem ganhar nada de nada e não se contém. Nessa altura era habitual perdermos derbys em casa e fora, mas no final quase sempre acabávamos a rir, até na época dos famosos 7-1, fomos campeões.
É a característica do derby "Raramente serás feliz à conta do vizinho rival". Ou seja, Benfica e Sporting podem ganhar títulos mas raramente conseguem arrancá-lo na cara do rival. Quando se consegue, claro, é o prazer supremo!

Há exemplos que espelham isto, uns traumatizantes outros deliciosos. O Sporting nos últimos dois títulos podia ter rebentado a festa nas trombas do seu rival. Podia mas não conseguiu, e apesar de nada ganharem os adeptos benfiquistas presentes nesses dois jogos no antigo estádio de Alvalade nunca esquecerão os golos de Sabry e Jankauskas.
Quando se fala em derbys vem sempre a conversa dos 7-1, esse foi o primeiro jogo que fui ver ao campo inimigo com o meu clube. Lembro-me do trabalhão e das promessas que fiz aos meus pais para poder ir com os amigos mais velhos a Alvalade. Mais valia estar quieto... Mas há um encontro mais traumatizante do que esse, foi na Luz quando o Benfica tinha que vencer o Sporting para se sagrar campeão. Nenhum benfiquista acreditava noutro resultado que não fosse a vitória, a verdade é que em poucos minutos os desgraçados de verde e branco fazem dois golos. O FC Porto aproveita e vence o Vitória no Bonfim. O Benfica ainda reduz mas o título vai para as Antas com cumprimentos leoninos. Foi traumatizante.

Tenho para mim que mesmo que houvesse uma temporada catastrófica que fizesse com que os rivais de Lisboa tivessem que lutar para não descer de divisão, o estádio estaria sempre cheio quando as equipas se defrontassem. Um jogo destes nunca é definitivo, dura para discussões extensas que só são abafadas com a chegada de novo jogo.
Até esta semana qualquer discussão com um lagarto teria de envolver a famosa frase "Já está!", com que um feliz locutor de rádio assinalou mais um lendário golo encarnado em Alvalade, o primeiro do novo estádio.

A partir se sábado novas incidências surgem para enriquecer a vasta história de confrontos com os nossos queridos inimigos. Domingo e segunda-feira lá vamos enfrentá-los no café, no trabalho, no supermercado, ao telefone. Só espero que o sorriso seja todo meu.

Tendo em conta a história recente do embate em campo verde, nós os benfiquistas, temos todas as razões para irmos confiantes. Nas últimas sete épocas, o Glorioso venceu por cinco e só perdeu uma! Por estas e por outras é que a corrida na Luz aos bilhetes é sempre renhida e faz gastar uma verdadeira loucura por cada entrada.

Não troco este derby por nada, que me desculpem os adeptos de todos os outros clubes, mas este é "O" derby! Não há nada que se compare ao encontro destes vizinhos. É quando os opostos se cruzam. Durante noventa minutos encaramos cada lance como se fosse decisivo para resolver a eterna questão de quem é melhor. O coração bate mais depressa, um golo nosso é o tal orgasmo de que o Fernando "bi-bota" Gomes tanto falava, um golo sofrido é como ter o mundo a desabar nas nossas cabeças. É muita emoção que só se justifica pelo prazer de no final irmos ao encontro dos nossos rivais que no fundo são uns amigalhaços e que precisam tanto desta rivalidade como nós.
Já sei que só vale 3 pontos, mas a vitória em Alvalade é purificadora. Força Benfica.

posted by J G at 6:56 da manhã

4 Comentários:

Grande texto, JG.
A minha categoria de derby preferida tb é a C (embora B seja, normalmente, sinal de final). Mas ao contrário de ti, e apesar de ser de Lisboa, uma vitória sobre o os andrades sabe-me ainda melhor que sobre os lagartos. Mas o jogo no Lumiar é aquele que , se calhar por uma questão de proximidade, não gosto de falhar. Para mim, o jogo do Lumiar é O JOGO. Mas este ano, dada a chulice dos preços, acho que vou falhar. Será a 2ª vez em quase vinte anos. Boa sorte aos que vão!
Anonymous Anónimo, at 3:53 da tarde  
eu vou
Blogger J G, at 4:44 da tarde  
Texto brilhante!!!
Blogger Galaad, at 1:02 da manhã  
Bem, este texto é sublime... e que tal reeditares o "Domingo Subjectivo" aqui, com "cara lavada"?
Blogger Pedro Neto, at 2:34 da tarde  

Comentar